Seria difícil para mim levar adiante aquilo que faço com maior prazer se não escrevesse por vezes um diário. Não que eu utilize essas anotações; elas nunca são a matéria-prima daquilo em que estou trabalhando. Porque um homem que conhece a intensidade de suas impressões; que sente cada detalhe de cada dia como se ele fosse seu único dia; que consiste – não se pode exprimir de outra forma – justamente no exagero, mas que não combate essa predisposição, pois para ele importa a ênfase, a nitidez e a concretude de todas as coisas que perfazem a vida – esse homem poderia explodir ou mesmo partir-se em pedaços se não se tranquilizasse num diário.
Elias Canetti, Diálogo com o Interlocutor Cruel
(trad. Márcio Suzuki)